O mendigo K., a felicidade e o manicômio social

"Fez uma ironia qualquer com aqueles escravos do estado e do relógio e desenrolou uma página de jornal que levava em baixo da camisa para mostrar-me a foto de um sujeito em transe acendendo seu improvisado cachimbo de crack...
- Veja a expressão de delírio e de felicidade desse cara! - Disse, olhando demoradamente para aquele sujeito entrincheirado num beco, os braços e as mãos... puros ossos, uma ferida imensa nos lábios... E prosseguiu:
Quê porra de mecanismo é esse que a simples fumaça de uma pedra pode causar? O quê acontece verdadeiramente nas carnes do pulmão e nos ligamentos cerebrais quando recebem a fumaça? Quê porra de química é essa? Quando é que saberemos a verdade a respeito do mundo que trazemos por detrás de nossos ossos?
E agora, querem curá-los! Logo agora que transcenderam a família, o trabalho, a mesa com oito talheres, as camisas engomadas, o papel higiênico com cheiro de sândalo... O medo de morrer! Logo agora que conseguiram trocar o travesseiro por um tijolo... Curá-los de quê? Dessa 'felicidade'? Oferecer-lhes o quê depois de curados? Como convencer-lhes que o tédio e que a melancolia doméstica são mais saudáveis que o frenesi do abismo?"




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