Remédio que cura não é rentável

Entrevista do bioquímico Richard John Roberts, prêmio Nobel de Medicina, a Lluis Amiguet, do jornal "La Vanguardia" (LV). (Íntegra, em espanhol, aqui)

LV: Qual modelo de pesquisas lhe parece mais eficaz, o dos EUA ou o europeu?
Richard: É óbvio que o estadunidense, no qual toma parte ativa o capital privado, é muito mais eficiente.
Tome-se como exemplo o avanço espetacular da indústria de informática, onde o dinheiro privado financia a pesquisa básica e aplicada, mas com respeito à indústria de saúde... Tenho minhas reservas.

LV: Estou te ouvindo.
Richard: A pesquisa na saúde humana não pode depender tão somente da rentabilidade econômica. O que é bom para os dividendos das empresas nem sempre é bom para as pessoas.

LV: Explíque-se.
Richard: A indústria farmacêutica quer servir aos mercados de capital.

LV: Como qualquer outra indústria.
Richard: Mas é que não é qualquer outra indústria: estamos falando de nossa saúde e nossas vidas, e as de nossos filhos e de milhões de seres humanos.

LV: Mas se são rentáveis, pesquisarão melhor.
Richard: Se você pensa apenas nos benefícios, deixa de preocupar-se por servir aos seres humanos.

LV: Por exemplo...
Richard: Comprovei que em alguns casos os pesquisadores dependentes de fundos privados teriam descoberto remédios muito eficazes que teriam acabado por completo com uma doença...

LV: E por que deixam de pesquisar?
Richard: Porque frequentemente as farmacêuticas não estão tão interessadas em curá-lo como em receber o seu dinheiro, assim que essa pesquisa, de repente, é desviada para a descoberta de remédios que não curam totalmente, senão que cronificam a doença e te fazem experimentar uma melhora que desaparece quando você deixa de tomar o medicamento.

LV: É uma acusação grave.
Richard: Pois é habitual que as farmacêuticas estejam interessadas nas linhas de pesquisa que não curam, mas que apenas cronificam dolências com medicamentos cronificadores muito mais rentáveis que os que curam completamente e de uma vez por todas. Não precisa mais que seguir a análise financeira da indústria farmacêutica e comprovará o que digo. 


NÃO CONFIE NOS LABORATÓRIOS

Ex-executivo da Pfizer diz que as práticas da indústria farmacêutica são ilegais e antiéticas

ÉPOCA
– Como a indústria farmacêutica se tornou tão poderosa?
Peter Rost – Eles ganham muito dinheiro, cerca de US$ 500 bilhões ao ano. E podem comprar a todos. Os laboratórios se tornaram donos da Casa Branca. O governo americano chega a negociar com os países pobres em nome deles. Como isso é feito? Os Estados Unidos pressionam esses países para que aceitem patentes além do prazo permitido (15 anos em média). Quando a patente se estende, os países demoram mais para ter acesso ao medicamento mais barato. E, se as nações pobres não aceitam a medida dos americanos, correm o risco de sofrer retaliação e de nem receber os medicamentos. Essa atitude é o equivalente a um assassinato em massa. Pessoas que dependem dos remédios para sobreviver, como os soropositivos, poderão morrer se o país não se sujeitar a esse esquema.

ÉPOCA – As práticas de venda da indústria farmacêutica colocam em risco a saúde da população mundial?
Rost – Não tenha dúvida. Basta lembrar o caso do Vioxx, antiinflamatório da Merck Sharp & Dohme retirado do mercado em 2004 por causar ataque cardíaco em milhares de pessoas pelo mundo.

ÉPOCA – Então, não podemos mais confiar nos laboratórios?
Rost– Não, não podemos confiar. A preocupação principal deles é ganhar dinheiro. As pessoas têm de se conscientizar disso. Cobrar posições claras de seus médicos, que também não são confiáveis, pois seguem as regras da indústria. Eles receitam o remédio do laboratório que lhes dá mais vantagens, como presentes ou viagens. É uma situação difícil para o paciente. Por isso, é importante ter a opinião de mais de um médico sobre uma doença. E checar se ele é ligado à indústria. Como saber? Verifique quantos brindes de laboratório ele tem no consultório. Se houver mais de cinco, é mau sinal.

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IMPULSO AGRESSIVO E DIABOLICAMENTE ARDILOSO DAS EMPRESAS FARMACÊUTICAS
Allen Frances, autor do livro Saving Normal faz uma autocrítica e questiona o fato de a principal referência acadêmica da psiquiatria contribuir para a crescente medicalização da vida.

"O DSM IV acabou sendo um dique frágil demais para frear o impulso agressivo e diabolicamente ardiloso das empresas farmacêuticas no sentido de introduzir novas entidades patológicas. Não soubemos nos antecipar ao poder dos laboratórios de fazer médicos, pais e pacientes acreditarem que o transtorno psiquiátrico é algo muito comum e de fácil solução. O resultado foi uma inflação diagnóstica que causa muito dano, especialmente na psiquiatria infantil. Agora, a ampliação de síndromes e patologias no DSM V vai transformar a atual inflação diagnóstica em hiperinflação."
...
"Os laboratórios estão enganando o público, fazendo acreditar que os problemas se resolvem com comprimidos. Mas não é assim. Os fármacos são necessários e muito úteis em transtornos mentais severos e persistentes, que provocam uma grande incapacidade. Mas não ajudam nos problemas cotidianos, pelo contrário: o excesso de medicação causa mais danos que benefícios."
Qual a solução?
"Controlar melhor a indústria e educar de novo os médicos e a sociedade, que aceita de forma muito acrítica as facilidades oferecidas para se medicar."

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E veja também
A indústria farmacêutica? “Um passado magnífico. Um presente estéril, feito de cobiça, mentiras e corrupção. Um futuro baseado na esperança...” Em seu Guia dos medicamentos, que provocou muito barulho, os professores Philippe Even e Bernard Debré jogaram merda no ventilador: dos 4 mil medicamentos comercializados na França, metade seria inútil, 20% mal tolerados e 5% potencialmente muito perigosos.
Diante da ganância dos laboratórios farmacêuticos, um projeto de tratado internacional busca separar o custo da pesquisa e o preço dos medicamentos, a fim de facilitar a descoberta de produtos eficazes e acessíveis às populações que mais precisam. Mesmo quando eles não se paguem

Nobel de Química diz que indústria farmacêutica não busca a cura
Para o bioquímico e biofísico molecular Thomas Steitz, laboratórios querem que pacientes usem medicamentos a vida toda. "Muitas das grandes farmacêuticas fecharam suas pesquisas sobre antibióticos porque estes curam as pessoas." 

O sistema de teste e aprovação dos remédios coloca controle excessivo nas mãos dos fabricantes, de forma que eles quase sempre podem definir qual o veredicto sobre qualquer medicamento em fase de experimentos.




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